Advogada especialista na área do Direito Civil relacionado à mídia, à publicidade e à internet, Taís Gasparian é fundadora e diretora do Instituto Tornavoz e sócia do escritório Rodrigues Barbosa, Mac Dowell de Figueiredo, Gasparian – Advogados. É mestre em Filosofia e Teoria Geral do Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo e em 2020 foi visiting scholar na Faculdade de Direito da Universidade de Yale (EUA). Também é colaboradora frequente da Universidade de Columbia (NY, EUA), no Global Freedom of Expression Website.
Agência Javali – Na sua opinião, por que os ataques à imprensa e à liberdade de expressão estão se tornando mais frequentes e complexos no Brasil?
Taís Gasparian: O mundo todo vive um momento de fragilização da democracia e, em momentos como esse, crescem os ataques às liberdades de imprensa e de expressão. Não é apenas um problema local, mas aqui a situação fica agravada por conta de diversos integrantes do governo federal que propagam informações falsas, aprofundando divergências e incitando discursos estigmatizantes que desacreditam as vítimas.
Observe que o pleno exercício da liberdade de imprensa coloca as autoridades públicas sob escrutínio, permitindo a fiscalização dos governos pela sociedade. Por óbvio, então, que os ataques à imprensa têm se tornado cada vez mais intensos.
Agência Javali – Esses ataques à liberdade de expressão impactam a grande mídia e os veículos de pequeno porte de maneira diferente? Por quê?
Taís Gasparian: Esses ataques têm um efeito terrível sobre toda a mídia, mas é evidente que veículos de pequeno e médio porte ficam mais vulneráveis. Defender-se em processos judiciais é custoso tanto em termos financeiros como para as decisões de negócio – por que escrever sobre algo que pode levar a um processo judicial e impedir a própria existência do veículo? Os recursos para o exercício do jornalismo profissional já são escassos e tudo isso pesa na balança.
Agência Javali – No seu ponto de vista, quais são os principais desafios que a liberdade de expressão enfrenta hoje em nosso país? Por quê?
Taís Gasparian: A instrumentalização do Poder Judiciário talvez seja o maior desafio. É necessário que se construam mecanismos para impedir o exercício abusivo do direito de ação. O Judiciário existe para solucionar conflitos da sociedade e não para ser usado como instrumento de intimidação.
Agência Javali – Diante deste cenário, quais são os objetivos do Instituto Tornavoz a curto e a longo prazo?
Taís Gasparian: No curto prazo é realmente assegurar uma defesa jurídica especializada àqueles que não possuem condições econômicas de arcar com honorários advocatícios – não deixar que as pessoas e pequenos veículos de mídia fiquem desamparados, sobretudo em um ano eleitoral.
No médio e longo prazo, pretendemos criar um obstáculo a esse ataque à liberdade de expressão. A litigância estruturada em defesa desse direito, tanto em casos individuais como em casos estratégicos, é algo que acreditamos que contribui para dar um recado: a sociedade civil está atenta, organizada e vai dar visibilidade aos abusos, vai buscar proteger os mais vulneráveis.
Agência Javali – Como funciona a defesa jurídica especializada oferecida pelo Instituto? Quem pode solicitar esse auxílio e quais públicos serão priorizados?
Taís Gasparian: Na verdade, o Tornavoz vai ajudar a custear a defesa; ou seja, os advogados que atuarem nos casos acolhidos pelo Instituto serão remunerados. A ideia é que essa remuneração fortaleça a advocacia por todo o país, de modo que os profissionais passem a enxergar essa área de atuação como interessante, e tornem-se cada vez mais fortes na defesa da liberdade de expressão.
Podem pedir o auxílio pessoas ou pequenos veículos de mídia que estejam sofrendo processos judiciais, em virtude do exercício de sua liberdade de expressão, e que não tenham condições de contratar defesa especializada. Como os recursos são limitados, será dada prioridade a casos que envolvam temáticas ligadas a grupos historicamente marginalizados, tais como, mulheres, pessoas negras, indígenas, LGBTQIA+, que estejam afastadas de grandes centros, e a veículos que se dediquem a tais temáticas ou tenham atuação local/regional.
Agência Javali – Além de oferecer defesa jurídica a quem necessita, o Instituto Tornavoz pretende fortalecer a jurisprudência sobre o tema. Quais são as iniciativas que a organização está desenvolvendo para atingir esse objetivo?
Taís Gasparian: O Tornavoz possui uma frente de litigância estratégica. O principal instrumento jurídico que o instituto possui é a atuação como amigo da corte (amicus curiae) em casos relevantes para a liberdade de expressão. Esse tipo de atuação ocorre com maior frequência quando os processos chegam ao STJ e ao STF, que são as mais altas cortes no Brasil. O Tornavoz quer intervir em um momento anterior, enquanto os processos ainda estão nos tribunais de segunda instância.
Agência Javali – Como os profissionais de Direito que estão interessados no Instituto podem participar da organização ou apoiá-la?
Taís Gasparian: Aqueles que querem colaborar podem preencher um formulário no site do Tornavoz (https://tornavoz.org/parcerias/).