François Le Grand possui mais de oito anos de experiência nos mercados jurídico e financeiro no Brasil e é, atualmente, editor-chefe da Leaders League Brasil, renomado ranking jurídico. Membro fundador do Brazil Forum UK, François já foi head da Chambers & Partners para o Brasil e ex-conselheiro do Araripe, think tank brasileiro que fomente políticas públicas eficazes.
Agência Javali – O ano de 2021 foi desafiador para a economia brasileira, mas também foi repleto de oportunidades e inovações para os escritórios de advocacia. Na sua opinião, quais foram os principais acontecimentos que afetaram o mercado jurídico em 2021?
François Le Grand: 2021 tem sido um ano intenso em termos de desenvolvimentos legislativos e transformações regulatórias para o mercado jurídico brasileiro. Uma série de novas leis de grande importância foram aprovadas nos últimos 12 meses, dentre as quais destaco a Nova lei de Recuperação Judicial e Falências (Lei 14.112/20), que entrou em vigor logo no início de 2021, a Nova Lei Geral de Licitações (Lei nº 14.133/21), sancionada em 1º de abril, e o muito esperado Marco Legal das Startups e do Empreendedorismo Inovador (Lei Complementar n° 182/2021), sancionado no dia 1º de junho, que visa a facilitar a criação e desenvolvimento de empresas inovadoras no Brasil.
Além disso, em 2021 o mercado jurídico nacional testemunhou grandes julgamentos cujas decisões tiveram repercussões significativas em suas respectivas áreas de prática. Neste âmbito, destaco a decisão de maio do Supremo Tribunal Federal (STF), que julgou a ‘Tese do Século’, na qual o ICMS foi removido da base de cálculo do PIS e da Cofins. Esta decisão merece particularmente ser lembrada pois gerou um rombo de R$ 358,1 bilhões para os cofres da União, segundo estimativa do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT). Outra decisão de grande impacto na esfera jurídica foi a invalidação de um trecho da Lei da Propriedade Industrial pelo STF, por coincidência também em maio, que decidiu por derrubar as patentes de produtos farmacêuticos que estavam em vigor há mais de 20 anos no país, atingido mais 3,4 mil patentes da área farmacêutica.
Devido a um volume recorde de ofertas públicas iniciais no Brasil – de acordo com a Bloomberg, R$ 65bilhões foram movimentados em IPO’s no país até o dia 6 de dezembro, quebrando o recorde de R$ 55 bilhões estabelecido em 2007 – os departamentos de Equity Capital Markets dos principais escritórios do Brasil foram extremamente demandados. O mesmo se aplica aos departamentos de fusões e aquisições visto que no primeiro semestre de 2021 este mercado cresceu 48% no país, de acordo com um levantamento da consultoria PwC Brasil.
Por último, em julho deste ano, o Conselho Federal da OAB aprovou novas regras para publicidade na advocacia, permitindo novidades como, por exemplo, o impulsionamento de postagens em redes sociais, entre outras. Essas novas regras certamente representam um dos acontecimentos mais importantes das últimas décadas na seara do marketing jurídico e, a meu ver, são um passo essencial na modernização do nosso mercado.
Agência Javali – Como os escritórios se adaptaram às transformações ocorridas em 2021? Quais dessas adaptações, na sua opinião, continuarão necessárias a longo prazo?
François Le Grand: Creio que as principais transformações em escritórios de advocacia – como na maioria de empresas e organizações – ocorreram a partir de março de 2020, com o início da pandemia e, subsequentemente, a necessidade de políticas de distanciamento social. Com relação a como os principais escritórios brasileiros se adaptaram a esta transição de um regime trabalhista 100% presencial à realidade do teletrabalho, a minha leitura é que tem sido um grande sucesso do ponto de vista operacional. Pelas várias conversas que tive com CEO’s, sócio-gestores e chefes de departamento dos maiores escritórios de advocacia do país ao longo de 2020 e 2021, a transição do presencial para o digital não resultou em perda de produtividade, muito pelo contrário, várias figuras confidenciaram que eles e suas equipes nunca trabalharam tanto em suas vidas.
Por outro lado, é evidente que o teletrabalho pode significar uma mudança extremamente positiva para muitos funcionários, especialmente para aqueles que vivem a uma hora ou mais do escritório físico e antes sacrificavam duas horas por dia em transporte público apenas para ir e voltar do seu local de trabalho. Neste cenário, que é a realidade para muitos estagiários e associados, são 10 horas recuperadas por semana que podem ser reinvestidas em exercício, estudos, relacionamentos e lazer, portanto, não podemos pormenorizar o impacto positivo deste novo modelo na vida de alguns colaboradores. Com isso em mente, fica claro que muitos funcionários não vão aceitar voltar ao modo antigo de trabalhar.
A maioria dos principais escritórios brasileiros já compreendeu isso e, de forma geral, o que está sendo proposto é um retorno parcial ao regime presencial e a instituição de um regime híbrido, com a presença no escritório duas ou três vezes por semana.
Nos últimos dois anos, também vimos os maiores escritórios de advocacia do Brasil investindo cada vez mais em suas próprias iniciativas de Diversidade & Inclusão e ESG, respondendo aos anseios da sociedade e às exigências do mercado. Esta transformação de mentalidade do mercado jurídico, especialmente com relação à diversidade racial, ainda está em seu estágio inicial. No entanto, é inegável que iniciativas importantes, como a ‘Incluir Direito’, estão trazendo crescente visibilidade para o assunto. Ao meu ver, no curto, médio e longo prazo, esses temas apenas se tornarão mais importantes tanto para a sociedade brasileira quanto para grandes multinacionais que, por exemplo, já exigem de seus parceiros a implementação de políticas de diversidade e de responsabilidade social. Não investir nessas duas frentes se tornará cada vez mais uma desvantagem competitiva e poderá resultar na perda de clientes.
Agência Javali – Em novembro, a Leaders League organizou dois eventos relevantes para os mercados jurídico e financeiro, o “Finance & Law Summit and Awards” e o “Brazil’s Legal Summit”, com a presença de importantes advogados e executivos. Quais foram as principais tendências apontadas por esses profissionais para o mercado jurídico em 2022?
François Le Grand: Ao longo dos dois eventos que ocorreram presencialmente no Tivoli Mofarrej em São Paulo, tivemos 16 painéis que cobriram as principais tendências econômicas e jurídicas ocorrendo no Brasil e contamos com a presença de renomados diretores jurídicos das principais empresas do Brasil como Suzano, Itaú, CPFL, Embraer, L’Oréal, Twitter, MercadoLivre, Via Varejo e muitos outros.
Destes 16 painéis, destacaria os de: i) ‘Modernização do Direito Bancário’ durante o qual os palestrantes discutiram sobre PIX, open banking e fintechs; ii) ‘Desafios da Inclusão e Diversidade e o Perfil do Novo Profissional Jurídico’ ao longo do qual os painelistas falaram sobre como implementar políticas de D&I dentro de suas instituições e os desafios que isso envolve; iii) ‘Governança Corporativa e Sustentabilidade’ no qual políticas de responsabilidade ambiental e social foram discutidas através dos case-studies da Suzano e da Braskem no contexto pós COP-26.
Para quem quiser conferir todos os painéis, basta acessar os sites do evento: www.brazillegalsummit.com.br e www.filasa.com.br. Ao longo das próximas semanas, divulgaremos trechos dos debates através de nossa página do LinkedIn: Leaders League Brasil.
Agência Javali – A equipe da Leaders League tem dedicado bastante atenção para a maneira como os escritórios de advocacia estão lidando com as questões raciais, LGBT+ e de gênero. Na sua opinião, o mercado jurídico brasileiro tem adotado boas iniciativas diante desse assunto? Podemos esperar ações mais significativas para 2022, pelo menos entre os grandes escritórios?
François Le Grand: Apesar da gritante desigualdade racial e de gênero que persiste no mercado jurídico brasileiro – especialmente no topo da hierarquia – devemos reconhecer que uma série de iniciativas têm buscado mudar a face do mercado.
A primeira iniciativa da Leaders League Brasil focada em diversidade e inclusão foi uma série editorial de quatro entrevistas lançada em novembro de 2020, cada uma com um representante de uma organização sem fins lucrativos, que buscava aumentar a diversidade racial, de gênero ou sexual. Entrevistamos líderes do Incluir Direito, Aliança Jurídica Pela Equidade Racial, Jurídico de Saias e da Comissão de Diversidade Sexual e de Gênero da OAB/SP.
Em 2021, não apenas mantivemos a nossa série editorial de Diversidade & Inclusão – desta vez entrevistando a renomada filósofa, autora e feminista negra, Djamila Ribeiro, a cofundadora do TransEmpregos, Maite Schneider, os cofundadores do Pride Bank, Marcio Orlandi e Maria Fuentes e a Diretora Financeira da PepsiCo, Flávia Schlesinger – mas também lançamos os nossos primeiros prêmios para o ‘Melhor Escritório de Advocacia em D&I’, vencido pelo TozziniFreire Advogados, e o ‘Melhor Escritório de Advocacia em ESG’, vencido pelo Mattos Filho Advogados, e organizamos um painel sobre ‘Desafios da Inclusão e Diversidade e o Perfil do Novo Profissional Jurídico’ durante o Brazil’s Legal Summit.
O fato de que o projeto ‘Incluir Direito’ do Centro de Estudos das Sociedades de Advogados (Cesa), que hoje tem 27 escritórios participantes, incluindo as maiores bancas do país, recentemente venceu o Prêmio Innovare 2021, é um sinal de que estamos na direção certa. Em meus oito anos como editor dos principais diretórios jurídicos voltados para o Brasil, primeiro na Chambers & Partners e depois na Leaders League Brasil, nunca vi o tema de diversidade e inclusão sendo tão valorizado pelos escritórios como é hoje.
Agência Javali – Em 2021, a Leaders League inaugurou o ranking brasileiro de Melhores Consultorias de Headhunting Jurídico. Como foi realizar a pesquisa sobre esse setor?
François Le Grand: Vale lembrar que a Leaders League não é apenas um diretório jurídico e que hoje, por exemplo, temos rankings cobrindo fundos, bancos, boutiques de M&A, câmaras de arbitragem, peritos, consultorias e, agora, de headhunters. Devido à nossa abordagem holística de ranqueamento e a força da nossa marca no mercado jurídico, lançar um ranking de headhunters jurídicos foi uma evolução natural.
Apesar de ser um ranking novo, a repercussão da pesquisa foi tão positiva que duas das principais consultorias de headhunting jurídico – Brava Executive Search e Laurence Simons – patrocinaram os nossos eventos de novembro.
Agência Javali – Além da pesquisa sobre headhunting jurídico, a Leaders League passou a contar com diversos outros rankings inéditos, como os rankings regionais e de setores econômicos. Quais novidades podemos esperar para o próximo ano?
François Le Grand: Em 2022, devemos lançar entre 15 e 20 novos rankings jurídicos e não-jurídicos. Estão confirmados para o ano que vem os seguintes novos rankings jurídicos: Anti-Pirataria, Direito Marítimo, Direito de Aviação, Comércio Internacional/Aduaneiro, Real Estate Finance e, além disso, quatro novos rankings regionais de Resolução de Conflitos.
O principal acontecimento do lado jurídico, portanto é a criação de alguns rankings específicos que nos faltavam junto com a continuidade de nossa expansão no mercado regional. Com relação aos novos rankings não-jurídicos, por ora, posso apenas confirmar o lançamento de 2-3 novos rankings de headhunters voltados para outros setores, embora existam cerca de 8-10 rankings adicionais cujo potencial está sendo estudado para lançamento. De toda forma, 2022 promete ser novamente um ano de forte crescimento, em todos os sentidos, para a Leaders League no Brasil.