O Brasil é o país que mais mata pessoas LGBTQIA+ no mundo. Em 2021 foram 316 mortes, segundo pesquisa do Observatório de Mortes e Violências contra LGBTQIA+. Além disso, o preconceito também afeta o dia a dia: desde a maneira como pessoas LGBTQIA+ são vistas pela sociedade até a total falta de oportunidade no mercado de trabalho.
As violências diárias, independentemente de sua natureza, elucidam a importância de um mês voltado à luta pelos direitos para a comunidade LGBTQIA+ e contra a LGBTfobia. A data marca o orgulho de pertencer; palavra de ordem, que busca, acima de tudo, o respeito e a equidade.
Nesse sentido, é importante ressaltar que a orientação sexual ou identidade de gênero diz respeito a quem ela pertence e não deve ser validada ou aceita por ninguém. É preciso que seja respeitada e guardada perante a lei.
O direito das pessoas LGBTQIA+
Atualmente, existem algumas legislações que buscam garantir os direitos das pessoas LGBTQIA+. São elas:
União Estável
Em 2011, o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a união estável entre pessoas do mesmo sexo, tal como em relações heterossexuais.
Casamento Civil
Também no ano de 2011, o casamento civil foi assegurado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Saúde
A portaria nº 2.836 instituiu a Política Nacional de Saúde Integral LGBTQIA+ na tentativa de eliminar o preconceito, contribuindo para redução das desigualdades e para consolidação do Sistema Único de Saúde (SUS), no Brasil, como sistema universal, integral e equitativo.
Retificação de nome
Alteração na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4275, que possibilitou a mudança de nome e gênero no registro civil para pessoas transexuais sem necessidade de procedimento cirúrgico. Um grande passo para que elas pudessem finalmente se reconhecer como quem são em um documento.
Punição da LGBTfobia
A Lei nº 7.716/1989 trouxe a possibilidade de atos homofóbicos e transfóbicos serem punidos como racismo, prevendo punição com reclusão de um a três anos e multa. Além disso, assim como o crime de racismo, a LGBTfobia é considerada crime inafiançável e imprescritível.
Doação de sangue
Em 2020, em decisão histórica, o STF permitiu que homossexuais e bissexuais pudessem doar sangue a terceiros no Brasil. Até então, a proibição se baseava no argumento preconceituoso de que pessoas LGBTQIA+, sobretudo homens gays, estariam mais propensos a transmitir DSTs.
Direito à adoção
Com a Resolução nº 175/2013 do casamento civil e união estável, também foi firmada a possibilidade de adoção por casais homoafetivos.
Apesar de os direitos existentes já serem um avanço considerando o passado, e de como a luta por eles conseguiu avançar nessa questão no Brasil, ainda há muito que se conquistar, principalmente no que diz respeito a inserção de pessoas LGBTQIA+ no mercado de trabalho e à garantia da proteção para elas.
Mercado de trabalho para pessoas LGBTQIA+
Existe um avanço no mercado atual em relação a empresas e ações sociais para promover mais vagas e/ou disponibilizar oportunidades direcionadas para as pessoas LGBTQIA+ no mercado de trabalho, como a iniciativa TransEmpregos, da qual Marcia Rocha, cofundadora, concedeu entrevista exclusiva à Javali e falou sobre o papel que a organização desempenha para a busca e contratação de empregos dignos para pessoas trans.
Além dela, outras empresas também trouxeram melhorias aos processos seletivos e aumentaram a empregabilidade, disponibilizando vagas voltadas somente para o público LGBTQIA+, por exemplo. As contratações têm crescido, porém isso levanta outra questão importante: o preconceito.
Segundo levantamento realizado pelo LinkedIn, 35% das pessoas que foram entrevistadas já sofreram preconceito dentro da empresa, como piadas e comentários homofóbicos. Por esse motivo muitos escolhem não revelar sua orientação sexual.
Dentro dos escritórios de advocacia, por exemplo, apesar do movimento da população LGBTQIA+ já ter desencadeado mudanças, ainda existe um grande caminho a ser percorrido.
Em entrevista ao Juridcast, Lívia Moraes, associada do escritório Barcellos Tucunduva Advogados, conta que levou tempo para que pudesse ser quem realmente é. “Para eu chegar ao ponto de ser abertamente lésbica e poder contar minhas experiências e fazer as minhas brincadeiras demorou muito, porque eu precisei me sentir confortável dentro do ambiente, do mercado, para eu parar de criar esse personagem e ser exatamente a Livia. A Livia advogada demorou para surgir nesse mercado jurídico, apesar de estar inserida nele há um tempo, porque eu não me sentia confortável dentro desse ambiente”, relata.
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Ouça o Juridcast: A importância da diversidade na advocacia
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Contudo, somente a contratação não é suficiente. As empresas precisam de um movimento interno para gerar mudanças reais e representativas para que a população LGBTQIA+ se sinta realmente acolhida e respeitada. É preciso sair da inércia e ter um time preparado para lidar com a diversidade em todas as suas formas, desde encarar junto com a comunidade os seus desafios no mercado até entender todas as possibilidades positivas dessa implementação.
Também em entrevista ao Juridcast, Glaúcia Alves Lourenço, que já atuou como diretora de Recursos Humanos no Trench Rossi Watanabe e agora é Head de RH na Tiffany & Co Brasil afirma que a inovação é a principal vantagem da inserção de diversidade dentro dos escritórios.
“O outro aspecto é a formação de pessoas mais conscientes. A partir do momento que eu trago a diversidade para a luz do meu quadro profissional, eu abro perspectivas para as pessoas conhecerem as vantagens de termos profissionais diversos no nosso time. É muito positivo. Quando você consegue colocar um profissional diverso na equipe, você dá oportunidade de fala, você consegue ver a contribuição e o engajamento que ele vai trazer dentro do time”, completa Lourenço.
Enxergar os desafios também é um caminho para pontuar os avanços. É claro que ainda existem muitas leis a serem implementadas, muito espaço para ser ocupado e muitos direitos a serem garantidos para as pessoas LGBTQIA+. Mas enxergar tantas empresas e bancas jurídicas se movimentando, o aumento das vagas e contratações, a luta por direitos crescendo, e a comunidade se fortalecendo, são vitórias a serem comemoradas.
São com esses passos e esse espaço que é possível comemorar o dia 28 de junho com orgulho, dignidade e força. E é trilhando esse caminho em comunidade e com consciência que cada dia mais a igualdade ganha força e o preconceito enfraquece.
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